terça-feira, 27 de abril de 2010

Um olhar de despedida

Lembrava de muita coisa, inclusive de um convite negado de viagem à Bruxelas. Então vestiu-se de homem de bem e foi vê-lo duas casas após a sua. Fez ressoar sua mão imposta à porta, apressado, até que ele ressurgisse da clareza branca da sala interna. Olhou cândido para a estranheza de quem abre a porta sem entender o motivo das visitas e esperou as palavras, o que não foi muito, quando o outro disse:
- Já que não gostas de Bruxelas, que tal irmos à Lua ?
- Impossível. Não podemos voar, como chegaríamos lá ?
Ele ficou calado, não esperava uma placa de negação a sua frente; no máximo uma risada e um abraço de saudade, o que não houve. Então, olhou para os pés, todo recolhido e perguntou sobre o almoço e a saúde. Respostas afirmativas dadas viu no silêncio um eco e regressou a passos pesados e dolorosos até sua casa, sem viagem à lua ou um abraço, apenas um olhar. Perdeu a geografia da casa e sem perceber passou a sua casa e outras mais, até que fosse pêgo pelo automóvel que virava a esquina.

sábado, 24 de abril de 2010

esvoaçar

e naquela tentativa de fundir-se a tudo aquilo que era vida e que o vento por isso levara, ou numa busca por perder-se no mesmo sopro de vento, ele levantava sua mão, fazendo-a transpassar o limite do vidro já caído. O veículo movia-se como que levando-o a qualquer lugar nenhum; ele estava: transitório. 

Suas mãos num esforço inútil de alcançar qualquer coisa que ele julgava palpavél, mesmo não o sendo lhe soava poético, mas aos demais parecia patécico como cheiro de gás, mas ele não via pois estava alerta para qualquer coisa que não deveria ser programada.

Sem música ou barulho, todos olhavam ele calado a estender a mão através da janela em movimeto num ensaio suicida. A quem desejava matar ? Mulher, compromissos, sonhos, ansiedades demasiado perigosas ? Só o silêncio de seus olhos esteticamente figurados no balançar das mãos poderia dizer, e era uma linguagem difícil de ser ler. Começava pelo começo, seguia em frente até o fim. e no fim, perdia-se como caído em qualquer buraco de vida. Por instantes perdeu a noção dos verbos até achar-se infantil refletido no retrovisor do veículo. Viu a mão a transpassar o limite, tudo que era segurança. Temeu e recolheu-a. Fechou os olhos e vestiu seus sonhos rigorosamente comprados e todos voltaram a seus papéis até chegaram à casa silenciosa e pálida como nada.

sábado, 3 de abril de 2010

Ofício n° 4

Sei que há em mim
algo que fala
por sussuros
pequenos silêncios
e é meu  dever
destino-dado
traduzi-los para  que
ao momento-fato,
tecidos e cosidos
ecoem além do pensamento
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