terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

A Segunda Página Arrancada

Cabedelo, 24/01/209


Há algum tempo pensava que o “Apologia da Torre” estava pronto, mas nessa quarta-feira me veio mais um texto que eu imagino pertencer-lhe. Cha¬mar-se-á “ A Fragmentação da Palavra”. Ei-lo aqui:

A
FRAGMENTAÇÃO DA PALAVRA
OU
A
PALAVRA DIZ-SE-CADA
{CAÍDA}
CUSPIDA
FUGIDA
PARIDA
NUTRIDA
FUSTIGADA
AMADA
TRATADA
ATADA A DUROS NÓS
OU A POESIA ACABADA
Talvez seja isso aí.

*****

Ainda há pouco ele disse-me assim: “Eu vejo a hora não ter tempo nem para eu mesmo”. Isso não é verdade. Todos temos a mesma quantidade de tempo, sejamos políticos, padres, mendigos ou policiais. O que acontece é que, fatidicamente, a maior parte de nós não sabe como usar o tempo. Saber usar o tempo implica em dar mais tempo a coisas importantes e o tempo ne¬cessário às coisas úteis. Não é tarefa das mais fáceis. Para sabermos o que é importante e o que é útil é preciso conhecer a si mesmo, e isso, ao que pa¬rece, há muito saiu de moda da nossa “civilização”.
Verdade é que tenho andando meio atordoado e confuso com tudo que acontece, e tanto mais com o que deixa de ser , o que não acontece. Sinto falta e algo a que eu possa me dedicar.
Desde que assisti As Horas, vez por outra fico me perguntando se o sen¬tido da minha vida existe, e mais que isso, se seu que sentido é esse. Aprendi com a velha lei do Espelho (as coisas se reproduzem igualmente em escalas di¬ferentes e em situações coerentes) que a forma mais rápida de conhecer os grandes fatos é reconhecê-los nas pequenas coisas.
Ando um tanto preocupado com a minha falta de responsabilidade para com minhas obrigações religiosas. Há muito venho prometendo ofertas à Her¬mes e o afamado busto de Ártemis e Apollon. Sou do tipo de homem que não gosta de enrolação. Posídon, meu pai, ensinou-me as responsabilidades dos homens nas redes de pesca.É preciso que eu cumpra com minhas promessas se quiser confiar em mim.
São tantas coisas que eu sinceramente não sei.


***
Não sei ao certo o que me toca. Ando balançado. Sensível, de certa forma até dissimulado; não posso abandonar minhas defesas. Como cheguei a certa conclusão há algum tempo atrás, eu sou uma bomba emocional prestes a explodir. É preciso que não me exponha muito; exibir as falhas , as imperfeições e torturas que me causaram sofrimento, não, não posso. Ao menos não diretamente. Preciso usar novas linguagens. Criar novas formas, novas teorias e formas de ver-ser no mundo. Não sei ao certo se o que escrevo, pinto, penso ou crio é bom. Mas sei que, ao menos em meu universo eles são significativos. São importantes. O resto: é resto, fica na classe das “utilidades”.
O que fazer ? Nada.

***
Não importa o quanto se diga, a gente sempre tem algo para dizer. Eu tenho pensado em muitas coisas. Não abro mão de pensar. Essa é uma das poucas coisas certas. Como dizia o Caetano “sabe gente, é tanta coisa pra gente aprender”, viver não é fácil.
Sou feliz ao lado dele. E quando não o vejo me sinto vazio. Por diversas vezes tento me corrigir quando pressinto isso. É uma mistura de necessidade e suicídio. Mistura estranha. Alquimia confusa. Mas... às vezes parece-me que ele gosta mais do que se foi. Tem amargor nas palavras quando comenta os passados, mas , mesmo assim, parece sentir-lhes falta, essencialmente do último.
Como já disse, estamos em reforma. Fomos a antiga casa onde ele morava com o outro. Um muquifo:pequeno e abafado; mercado de pulgas, ninho de ratos. Mas... lhe tem boas lembranças, e , aos meus olhos, é isso que interessa, e isso que o faz ser um castelo magnífico.Como não sei ser pedreiro, ofereci-me em troca por um dia com ele. Ele me deixaria na situação em que o outro está, e teria-o por um dia, a fim de ajudá-lo nas coisas que não sei fazer. Amor se faz na cozinha, e como tal, é lá que se processam grande parte dos meus sentimentos. Criticar o que cozinho é como comentar os meus sentimentos, além do quê só cozinho para as pessoas de que gosto. E gosto dele. Ele me diz: “Ele faz uma comida...” e dá aquele suspiro de vontade.
Por vezes me sinto angustiado. Ao que parece a minha dedicação não se percebe; e , ambiguamente, na maior parte das vezes me sinto o mais feliz do mundo, basta ele estar por perto, ou ao lado. Mas, quando bate agonia... parece que estou falando na direção errada. Tudo para dentro, sem que seja ouvido.
Um dia há de explodir.

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