sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Escritos de Outono


Os deuses anunciavam uma nova aurora vindoura. A doçura ventos do verão aos poucos se esvaía. Em seu lugar brotava um vento furioso, mas repleto de paixão; a culpa não era sua.Talvez a mãe dos ventos não o tivesse ensinado os mistérios do amor e fora ele obrigado a ter de aprender sozinho. O verão dava sua vez ao Outono. Tudo tem um ritmo a ser respeitado.

No centro da velha mata a nossa mangueira já não nos dava mais de comer. Respeitávamos o repouso desta mãe verde que durante meses alimentava aos nossos buchos vazios de aventura, quando não, também de comida. Outrora voltaria ela a mostrar-se verde, bela e imponente bem no centro da mata com seus frutos a tiracolo. Pelas ruas, os mil folhas, antes tão falantes entre si, fechavam-se em suas falas. Era um diálogo mudo, surdo e inexistente, eram conversas de outono. Teríamos de nos acostumar; durante o restante do fim do ano, aquele silêncio seria a sinfonia que nos guiaria. Era o silêncio do outono.

Estranhamente, não apenas as plantas fechavam suas falas em delicadas gavetas esverdeadas. Nós também o fazíamos. Parece que a natureza realmente nos moldava, quiséssemos ou não. Num ritmo que desafiava a lógica das estações, ao meu entender, cessávamos aquilo que já era escasso.

Acostumei-me, infelizmente, a ver todos aqueles a quem eu amava em um silêncio fúnebre. Isto me fez perceber que o silêncio é necessário para quem deseja aprender os mistérios. É o primeiro passo para quem anseia o saber. É um preço alto. Não falávamos, não escrevíamos, não fazíamos os delicados desenhos que os meninos da rua faziam em dias de chuva – aqueles sóis desenhados ao chão, eram a nossa maior alegria, mistérios e saber. Tudo exalava um silêncio. Encerrávamos num círculo de silêncio. A incomunicabilidade do outono. Minha lógica diferia daquilo que praticava. Em minha idéia deveríamos escrever longas cartas, preferencialmente repletas de ilustrações. Conversar na frente do fogo; deveríamos exercer o dom que fora roubado cruelmente de nossos antepassados. Mas, há uma delicada silhueta de beleza nessas curvas frias, nesta Senhora triste que é a portadora dos outonos. Não podemos esquecer que é nesta época que a feliz e doce Cora deixa os braços quentes da sua mãe, os acalantos da Primavera e volta ao submundo para o abraço escurecido de seu marido; é lá, junto dEle, que ela reina sobre os não-vivos e passa a ser chamada Perséfone.

Há os que adoram esta melancolia e a cultuam. É preciso respeitá-los também até na morte há um traço de beleza e doçura. A natureza se nos mostra sobre várias faces e cada qual tem seu encanto e beleza. Mas ao fim, percebe-se que sempre são aspectos de uma mesma mãe. É preciso cultuar o divino em suas diversas manifestações. Então se faz necessário compreender os mistérios desta melancolia e tristeza da natureza e dela, retirar sua beleza. Uma beleza que mostra o renascimento da vida. Não é preciso consolar o choro de Deméter, mas compreendê-la e respeitar sua dor. Quando não podemos consolar um choro de alguém o ato mais sensato é juntar-se aos que choram.

Sejamos outono! Falemos! Amemos e sejamos o que sempre fomos e também o que nos negamos a ser. Este é o espírito do Outono.Sejamos magos, bruxos e amigos mais humanos! Sejamos natureza, pois ela está-me nós também. Sejamos sempre as crianças que comem manda e brincam descalças no meio da mata ,tentando dar vida ao seu silêncio. Nunca nos esqueçamos de tecer bordados com os sonhos, nem de tecer bordados estrelares. As estrelas não se esqueceram de nós; sempre estarão na abertura mágicka da janela, pois esta é sua missão. Qual é a sua?

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